Tratar da governança – a letra “g” pouco debatida nesta era do ESG – pode ser uma tarefa muito complexa, ou talvez simples, se entendermos que ela é meio e não fim. E que por mais que se aplique o rigor técnico, o sistema de governança depende, em elevada escala, de quem são os seus agentes.
Sobre o que atuar, como atuar, quando atuar, são situações previstas em incontáveis documentos acadêmicos, normas legais e regulatórias, mas tudo ao final repousa sobre os indivíduos, sua integridade e qualificação, que é a quem pertence o direito de exercer seus votos e tomar decisões.
A complexidade vem do fato de que esse sistema detém o poder sobre as decisões críticas das empresas, como também a responsabilidade pelo seu monitoramento e orientação no sentido da correção de rumos. Isso se dá, como no presente momento, em ambientes em constante mutação e, apesar de a responsabilidade final repousar sobre pessoas, é fundamental o entendimento da dinâmica de funcionamento desse sistema.
A governança pode ser simples
A simplicidade pode ser induzida pelo entendimento, mais simplificado, de que esse sistema opera, em larga margem, sobre dois conjuntos de processos: os de preservação de valor e os de criação de valor adicional. A ênfase sobre um grupo ou outro depende da conjuntura e circunstâncias vividas a cada momento, o pêndulo oscila. No ciclo em que se registraram desvios e corrupção no âmbito empresarial, a prioridade foram os assuntos relacionados à conformidade, por exemplo. Hoje há igual intensidade no uso dos dois grupos de processo.
A complexidade pode advir de ambientes de grandes e variados desafios estratégicos como os que vivenciamos hoje. Esses desafios vêm desde as ameaças de disrupção e mudança de hábitos de consumo, como exemplo, o que determina a necessidade de adaptar os modelos de negócio a essa nova realidade. Essa matéria envolve o processo de planejamento estratégico que visa a criação de valor adicional e, ao mesmo tempo, o processo da gestão de riscos, que busca a preservação do negócio e protegê-lo das ameaças existentes.
Complexa ainda é a adaptação cultural às demandas que hoje a sociedade exerce sobre as empresas. Depois de um longo ciclo em que grande parte das decisões do sistema de governança era voltado a atender essencialmente às demandas do capital, fator mais relevante para as atividades produtivas até aqui, as demandas hoje exercidas por todas as partes interessadas, se não forem consideradas, podem determinar a escassez de moeda de grande valor, a lealdade desse conjunto de pessoas.
O papel dos acionistas e administradores
Essencial também compreender a centralidade do envolvimento dos acionistas e administradores e que por eles passam todas as decisões relevantes de uma empresa sendo, portanto, fundamental a construção da agenda pois esta é espinha dorsal do sistema decisório.
Assim, complexidade e simplicidade devem ser tratadas com o entendimento de que o que se espera do sistema de governança é que este sirva como meio para a busca do melhor desempenho na busca do resultado sustentável.
Para o futuro, citaria Helle Jorgenssem, “o futuro da boa governança corporativa começou a superar a noção de pensamento transacional com respeito à tomada de decisão. A nova abordagem requer profunda reflexão sobre propósito, analise estratégica, e consideração à todas as perspectivas em um esforço para alcançar rentabilidade de curto prazo e criação de valor sustentável no longo prazo”.
*Jose Guimarães Monforte é economista, ex-presidente do conselho do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa e participou de conselhos de grandes empresas como Natura, Petrobras, Eletrobras, entre outras. Foi responsável por organizar a estratégia de governança da Natura, que resultou na abertura de capital da companhia, em 2004.
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